A LICENÇA DE USO E PORTE DE ISQUEIRO
Fleming de Oliveira
Há
coisas que, vistas à distância dos anos, parecem incompreensíveis.
É
vulgar achar graça ao compararem-se preços com os do antigamente, algumas
tradições, artes, que se foram perdendo ou as novas, velhas facilidades ou
dificuldades da vida.
Algumas
situações tidas como naturais, no tempo
da outra senhora, levantam as maiores reservas ou dúvidas nos rapazes e
raparigas que hoje têm 40 anos, como se tratasse de ingénuos contos da carochinha.
Lembrem-se,
algumas restrições aos direitos, liberdades e garantias que afetavam a
população, as incapacidades cívicas e políticas de que padecia a mulher
relativamente ao homem, fosse ele marido ou não!!!.
Até
aos anos 70 do século passado, em Portugal, era proibido o uso ou simples detenção de acendedores ou isqueiros que
estejam em condições de funcionar quando os seus portadores não se achem
munidos da licença fiscal. Os infratores eram punidos com a multa de
250$00, além de sofrerem a perda dos aparelhos. O mesmo diploma acentuava que
das multas, no caso de haver denunciante, lhe caberia uma parte (37$50),
correspondente à metade da comissão do
autuante. Admitindo que não era relativamente exagerado o valor da licença
semestral (50$00 em maio de 1970) tratava-se, de uma pequena gota de água no
oceano do Orçamento do Estado.
Claro
que havia muita gente que não tinha licença de isqueiro (num tempo em que quase
todos eram a gasolina), mais não fosse por uma questão de princípio. Estavam a
aparecer no mercado os isqueiros a gás, os BIC
(descartáveis e recarregáveis). No
último semestre de 1969, cerca de 8.000 portugueses da Metrópole, tiraram licença
de isqueiro. No Ultramar, não
vigorava esta imposição.
O
Conselho de Ministros, presidido por Caetano, ao decretar a abolição, não fez
mais do que dar uma pequena satisfação a uns tantos portugueses. Acabou-se uma
prática, sem paralelo na Europa, que pouco beneficiava o Estado, implicava
incómodos aos cidadãos em demoras arreliadoras para obter o impresso adequado,
que custava $50 numa Repartição de Finanças, apenas onde era facultado e entregue.
O preceito inseria-se na forma como, politicamente, o regime tratava certos
assuntos.
A Licença de Isqueiro foi instituída em
1937 e, terá tido como razão, a proteção da indústria fosforeira nacional. O
diploma não fazia referência ao destino das verbas recolhidas. A decisão de Caetano,
não teve impacto de maior, até porque veio beneficiar apenas alguns fumadores,
mas foi saudada, como uma manifestação de distensão da Situação.
Pelo
menos, os fumadores com isqueiro deixaram de estar preocupados com a eventual e
irritante presença de um fiscal, o fiscal
de isqueiros.
NOTA-cfr. o nosso, NO TEMPO DE
SALAZAR, CAETANO E OUTROS
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